Raio-X da redação do Enem: crase, ‘por que’ ou ‘porque’, (a)onde… erros comuns em uma análise de 240 mil textos
DA REDAÇÃO | G1
A redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deixa muitos estudantes ansiosos porque o desempenho na escrita é crucial para uma boa colocação. A nota é muitas vezes usada como critério de desempate na disputa por vagas em universidades. Na outra ponta, quem zera em redação fica de fora de programas de acesso ao ensino superior, como o Prouni e o Fies.
A menos de 100 dias do exame, reúne-se dicas para quem precisar se preparar para a prova. De olho na nota 1.000, os estudantes precisam vencer desafios. Crase, acentos, uso de “onde”, “aonde”, e dos porquês são alguns dos erros mais comuns nas redações do Enem.
Redações com notas menores possuem menos pontuação no texto, poucos recursos coesivos, e falham na proposta de intervenção.
A conclusão é de uma análise feita pela Letrus, uma empresa de tecnologia com foco em educação. Usando inteligência artificial, um programa processou dados de mais de 240 mil redações feitas por estudantes do ensino médio, a partir de temas propostos para o Enem.
O “raio-X” dessas redações mapeia o que há nos textos com melhor avaliação e como são aqueles com notas menores.
Os dados mostram que alguns dos erros frequentes são:
• 27% das redações erram crase
• 8,1% dos textos têm erros de acentuação
• redações com notas mais altas têm mais pontos finais e vírgulas
• em notas a partir de 701 pontos, o uso de parênteses aparece com mais frequência
• 2,33% das redações erram o uso de “onde” e “aonde”
• 1,12% trazem erros no uso dos porquês
• 0,48% têm erro no uso de “através” e “por meio de”
• 0,29% apresenta erro ao trocar, “mas” e “mais”
• pontos de exclamação e interrogação são raros em redações nota 1.000, e mais frequentes em redações de 0 a 200 pontos
“Muitos textos do Enem têm apenas um parágrafo e um ponto final. Mas uma redação nota 1.000 tem até 4 pontos por parágrafo, os períodos são de tamanho médio, e há cadência no texto a partir da pontuação”, afirma Luis Junqueira, da Letrus.
Ele destaca que uma das maiores diferenças entre as redações de alunos de escolas públicas e particulares é a avaliação da “competência 5”, que observa se o estudante sabe se posicionar de maneira crítica e argumentar a favor de um ponto de vista com respeito aos direitos humanos.
“A competência 5 expressa a maior desigualdade entre alunos de escolas particulares e públicas. A nota é discrepante entre estes universos”, declara.
“A prova de redação é importante, e também temida por muita gente, porque representa uma construção do raciocínio que o candidato faz no momento da prova sobre o tema, de improviso. Ela mede a capacidade que o participante tem de elaborar uma reflexão pessoal, autoral, respeitando os limites do tema, e avalia a capacidade de escrita, de pensar com clareza, de estruturar texto e de respeitar os direitos humanos”, explica o coordenador de Linguagens do Curso Anglo, Sérgio Paganim.
Confira abaixo alguns erros nas redações do Enem:
Uso da crase
A análise aponta que 1 em cada 4 redações (27%) tem erros de crase. A maior parte é por não saber acentuar o artigo seguido de preposição.
Além disso, os estudantes erram a grafia do acento, escrevendo “á” em vez de “à”. Em terceiro lugar, vem o uso incorreto da crase onde não deveria haver.
Para não errar, Paganim sugere a análise sintática da frase. É preciso que o estudante reflita no momento sobre qual é o termo ou verbo que rege a sentença.
“A questão mais importante é olhar o termo que vem à direita, porque crase ocorre essencialmente com substantivos femininos”, explica.
Acento
Confira abaixo as 10 palavras que aparecem com maior frequência entre os erros de acentuação. Segundo a análise da Letrus, o erro mais comum envolvendo essas palavras é a posição incorreta do acento. A grafia correta é:
- públicas
- número
- políticas
- família
- últimos
- vítimas
- tecnológicos
- público
- índice
- período
Além do posicionamento incorreto do acento, há palavras que deveriam ser acentuadas e não são, como em “crítico”, “prático”, “público” e “propício”.
Para o coordenador de linguagens do Anglo, a dica é prestar atenção durante a grafia da redação e ler bastante. “Um hábito de leitura constante ajuda a internalizar essas regras, muitas vezes”, afirma.
‘Onde’, ‘Aonde’ e ‘porquês’
Outro erro frequente é o emprego incorreto de palavras com escrita parecida.
Entre os textos com erros de uso do “onde” e “aonde”, 32,9% obtiveram nota entre 201 e 500 e 49,7% estavam com nota entre 501 e 700 pontos, em um total de 1.000 pontos possíveis na redação do Enem.
Em relação a redações que apresentaram erros de utilização dos porquês, 37,5% estavam com nota entre 201 e 500 e 44,8% estavam com nota entre 501 e 700 pontos.
Paganim relembra que o uso de “onde” vai depender do lugar em que a palavra aparece na frase e se está combinado com o verbo.
“Se eu quero dizer ‘aonde você quer chegar com isso’ depende da noção do verbo ‘chegar’, que exige preposição”, explica.
Já o uso dos porquês também tem suas regras. “Precisa saber que o ‘por que’ para perguntas, no começo da frase, é separado. A resposta é com ‘porque’ junto (uma conjunção explicativa). O ‘porquê’, quando é substantivo, vem escrito tudo junto e com acento”, explica.
“Mas o caso mais complexo é a pergunta indireta. Por exemplo: ‘Eu gostaria de saber por que você escreveu o texto. É uma pergunta, porque tem ‘gostaria’, mas não tem ponto de interrogação. Neste caso, o ‘por que’ vai separado”, afirma.
Proposta de intervenção
Paganim conta que é comum os estudantes errarem a proposta de intervenção, analisada na Competência 5.
A dissertação do Enem é feita, em geral, em 4 parágrafos. Espera-se, diz Paganim, que no último parágrafo do texto o candidato traga uma proposta de solução ou de abordagem para o que está no tema da redação.
Em 2019, foi a “Democratização do acesso ao cinema”. Em 2018, foi a “Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet”.
Segundo Paganim, uma forma de organizar a proposta de intervenção (que será o último parágrafo) é:
• apresentar a ação
• citar quem vai agir
• apresentar um meio de ação
• propor uma finalidade
Para treinar, ele sugere que os candidatos façam uma redação por semana, com base em temas anteriores do Enem. “Em uma semana, ele faz com o tempo cronometrado, na semana seguinte, se dá um tempo para pesquisar e escrever com calma. Assim ele treina a velocidade da escrita e do raciocínio e também compõe repertório”, sugere.
“Se você olhar os textos nota 1.000 do Enem, é um texto mecânico, com a mesma estrutura. As redações possuem todos estes elementos muito bem marcados”, afirma Paganim.